terça-feira, 31 de dezembro de 2013

A cimalha e o alicerce - dos gregos aos assírios



Costuma dizer-se que a nossa palavra “cimalha” nasceu de um termo latino hipotético “cymacula”, ele próprio proveniente de uma palavra do “latim popular” “cyma”, sendo esta originária do grego “kyma”, que significava “rebento novo”. Simplesmente esse termo nunca existiu, não passando de uma palavra imaginada modernamente para justificar a existência da nossa “cimalha”.Também o chamado “latim popular” não é latim, e o “kima” grego é um “rebento de planta”… trapalhices. 



Quem conheça um pouco das línguas antigas do Próximo Oriente como o acádio, o assírio, o hebraico ou o ugarítico, verá imediatamente que este “alha” do final da palavra “cimalha” provém de “øl”  [âle] ou formas foneticamente próximas, que significam sempre “por cima, altura, por cima de, câmara superior, obra, etc.". A primeira parte da palavra, o “cima”, é comum ao nosso “cimo” e “cima”, e provém de “kima”, que significa precisamente “cimo” em acádio e assírio. Portanto a nossa “cimalha” é proveniente da forma fenícia “kimaøl” [cimaâle], que significa “cimo mais alto”, "cimo da obra" ou “cimo da câmara superior”. É possível que tenha tido precisamente o significado de "cimo da obra", dado que a palavra "alicerce" deve ter nascido de “ølsrs"  [âleserse] que significa "raiz da obra". 

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

As abóbadas e a sua origem

Já é quase vício: tenho meia hora de boa vida e entretenho-me a descobrir mais umas palavritas cuja etimologia anda enganada. Agora foi a nossa tão tradicional "abóbada", que se tem dito que nasceu de... ora vejam mais uma entrada que vai constar da próxima edição do meu "A Origem da Língua Portuguesa"...

"Os dicionários usualmente referem que a palavra “abóbada” teve origem numa hipotética forma latina “volvita”, part. pass. fem. pop. de “volvere”, que significa em latim “voltar; revirar”. Evidentemente que esta possibilidade é pouco verosímil, e em fenício pode ser encontrada uma possível raiz bem mais aceitável. A forma “øwb” significa em fenício “obscurecer, cobrir com nuvens”; a forma “øwp” é “estar escuro, cobrir com trevas”; “øb” é “alpendre, baldaquino”. Por outro lado “bt” (ou “bitu”) é “casa, palácio, templo, sala”. Assim, “øwbbt” [âobabete] será “cobertura da casa”, “cobertura do palácio”, etc."

sábado, 28 de dezembro de 2013

As charnecas em Portugal e no Brasil


Os nossos dicionários geralmente incluem a palavra “charneca” num grupo de palavras que classificam como sendo “de origem obscura”.  Estas palavras ditas “de origem obscura” são quase sempre de origem fenícia, e não é necessário muito esforço para encontrar essa mesma origem. No caso da “charneca” existe uma característica que aparentemente complica a compreensão da sua etimologia: em Portugal as “charneca” são quase sempre terrenos arenosos, pobres e secos, enquanto no Brasil correspondem a terras pantanosas e alagadiças. Alguns vêm nesta diferença uma contradição estranha e inexplicável,  porque julgam que a origem do nome está diretamente relacionada com as características físicas da terra.
De facto o nome não nasceu da maior ou menor secura do terreno, mas antes da característica de se tratar de “terra sem dono”. Etimologicamente a nossa “charneca” teve origem em “ṣeru”, que em acádio e assírio significa “planície, campo, estepe”. A este radical, que originou o início da palavra, juntou-se um outro, o “nqh”, que significa “ser livre, estar isento”. Assim, a nossa palavra “charneca” nasceu da forma “sernqh” e desta ideia de “terreno sem dono”, “terra livre”, “estepe ou campo livre”, o que pelo menos em certo período tanto se aplicava aos terrenos arenosos e pobres de Portugal, como a terrenos pantanosos do Brasil.

Carta n.º 603 dos S.C.E. na esc. 1:25000

Curiosamente existem na toponímia portuguesa marcas da apropriação dessas terras que em tempos foram “livres”. Em várias situações os topónimos “sesmaria” (ou “sismaria”) e “charneca” ainda hoje são muito próximos. Observem-se os exemplos que junto.


Carta n.º 555 dos S.C.E. na esc. 1:25000

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

AS VELHAS LENDAS FENÍCIAS QUE AINDA SOBREVIVEM

Pintura de Carlos Porfírio existente no Museu de Faro

Zorra berradeira

A “Zorra berradeira” é uma entidade mítica das serras do Baixo Alentejo e Alarve. Entre todos os “medos” de que ouvi falar nesta região é o mais temido. Na aldeia de S. Luís também é conhecida por “zorra magra”. Entre os velhos, há quem afirme tê-la ouvido de noite, e tratar-se de um animal que nunca ninguém vê, mas que existia; mas há também quem afirme nunca a ter ouvido, e tratar-se de um “medo” com que antigamente se assustava as pessoas, e particularmente os jovens.

Em “O Algarve Encantado na Obra de Carlos Porfírio” (edição do Museu de Faro - 2001) há uma descrição deste, feita no séc. XIX, por Francisco Xavier de Ataíde Oliveira. Essa descrição tem mais detalhes que os que até hoje tenho conseguido pelos testemunhos diretos dos velhos do concelho de Odemira. Diz:

“O povo do Algarve fala da zorra berradeira com um medo horrível.
Diversas são as opiniões que correm a respeito dessa entidade malfazeja.
Uns afirmam que a zorra berradeira é uma transformação de moura encantada. Certa moura encantada, desejando escapar-se aos funestos efeitos do encantamento, rebelou-se contra Allah, que a castigou, desgarrando-a e tornando-a objecto de ódio de toda a gente, mouros e cristãos.
Outros sustentam que aquele ser horrível é a alma penada de uma velha, em vida muito má, e que respondia a quem lhe censurava a sua vida escandalosa:
- Neste mundo anda-se como se quer. Porque no outro nada podem saber.
De noite, a deshoras, tem muita gente ouvido berrar, nos cumes dos mais agrestes serros, a zorra fatal. Vista de longe parece uma cabra, de mais perto uma imunda ave, de enormes dimensões, com as asas manchadas e sujas. É o verdadeiro retracto das arpias de outras eras.
Pessoas há que têm sido acometidas de noite pela zorra berradeira e se têm visto em grande perigo. Salta sobre o indivíduo com uma força enorme e no mesmo momento, como um velo arremessado pela força do vento, vai pousar sobre o serro mais alto. Exala de si um vapor imundo e nojento e, berrando atroa os serros e vales.
Em muitos concelhos do Algarve é a zorra berradeira muito mais temível do que as mouras encantadas ou as bruxas.
Parece que nos seus berros só anuncia desgraças e maldades.
Enquanto as Gens ou Jens são uns seres bem fazejos e queridos, a zorra berradeira é má e odiada por toda a gente.
A zorra berradeira é verdadeiramente a transformação das fúrias dos antigos. É tão má como estas e como estas igualmente temida.
Quando alguém tem a infelicidade de ouvir de noite a zorra berradeira, conta logo com desgraça em casa.
(…)
Quando se pergunta a alguém, onde reside a zorra berradeira, responde imediatamente:
Em Odelouca.
Odelouca é uma ribeira que vem desaguar no rio de Portimão.
Há ocasiões em que a zorra berradeira se converte em um verdadeiro flagelo no concelho de Monchique. Os habitantes dos sítios de Odelouca não se atrevem a sair de suas casas, à noite. (…)”

Vejamos a origem provável desta entidade:

SØR ou SØIR [ZOUR ou ZOUIR] é um “bode; cabeludo; demónio (em forma de bode)”, mas também “horrorizar-se, eriçar-se, tempestuoso; temor, tempestade; tornar-se tempestuoso, tempestade, ficar perplexo, voar (…)”. Por outro lado ZWR [ZUÔR] quer dizer “feder, ser intolerável[1]. É claro que esta “zorra” pouco tem que ver com a raposa, que por aqui também se chama zorra. A única relação vem do ZWR – cheirar mal, que de resto está possivelmente na origem do nome popular do carnívoro.

“Berradeira” provém certamente de BRD+HR [bêrrêdeir], e significa “animal manchado da serra”. Este BRD é comum ao nome de um pequeno carnívoro que existe no Sul do país, e que por aqui se chama “escalabardo”. Repare-se que este “escalabardo” não é mais que SKL+BRD – proceder mal, ou ser insensato + animal manchado.

O outro nome que encontramos em S. Luís – “Magra” – deve provir de “MAGÔR”, que em hebraico antigo significa “espanto, horror”, ou de “MGR” – “deitar por terra, derrubar para baixo”.

Assim a zorra berradeira deve ter significado inicialmente “animal manchado da serra + demónio (em forma de bode)”, ou numa tradução mais fácil, “demónio (em forma de bode) manchado da serra”. Mais tarde, foram-se acrescentando novos atributos aos originais, atributos esses que resultam, como acontece em muitos outros casos, de significados de expressões foneticamente próximas, quer oriundas das línguas semitas antigas, quer do português actual. Por isso o animal também “voa” numa “tempestade” (SØR), e “exala em si um vapor imundo e nojento” (ZWR).
                                                                                    
É provável que este ser mítico das serras do Sul seja uma importação de um mito antigo do próximo oriente que viajou com os colonos que por aqui vieram estabelecer-se, e não, como se poderia pensar, de um mito criado nesta região do país. Será mesmo muito provável que actualmente a zorra berradeira já não exista em lado algum da região do mediterrâneo oriental onde provavelmente nasceu, e tenha permanecido nesta antiga colónia distante entre os descendentes dos emigrantes desses tempos. Pode ser algo semelhante ao que acontece ainda hoje na ilha do Príncipe, em que se representam episódios de combates entre mouros e cristãos, alguns dos quais já esquecidos em Portugal, mas que se mantêm vivos na nossa antiga colónia.




[1] - Este deve ser um, entre muitos casos, em que um termo da língua popular se funde com o latim para dar origem a um termo do português. “Suor” do português deve a confluência espontânea entre o “SUDOR” latino com o ZUÔR semita.

sábado, 21 de dezembro de 2013

A nossa romã, os romanos e os fenícios



Aceita-se usualmente que a nossa palavra “romã” tenha tido uma origem latina, em “romana (mala)”, que seria “maçã romana”. Não resisto a salientar a obcecação latinista dos nossos letrados, que por vezes (como é o caso) os fez roçar o ridículo. Já no século XIX o Cardeal Saraiva referia a origem hebraica da palavra. Vale a pena citar um pouco do seu texto sobre o assunto:
“…porque o nome malum punicum, que lhe deram os latinos, parece indicar que esta planta tinha sido introduzida na Europa pelos carthaginezes.”. Ainda assim os nossos latinistas procuram a origem da palavra “romã” em “Roma”.
Lendo o texto do Cardeal Saraiva não se pode dizer que não se sabia a origem da palavra "romã", e terá que se admitir que insistir no erro terá já sido má fé. Para isso inventara mesmo a forma hipotética “mala romana”, sabendo-se precisamente que os romanos lhe chamavam “malum punicum”. Digamos que é preciso ser absolutamente obcecado pelos romanos e ao mesmo tempo não ter o mínimo de rigor científico.
 Na verdade a palavra deve ser fenícia, já que “rumôn” em hebraico antigo significa precisamente “romã”. Se já no século XIX se sabia isto, por que motivo os dicionários do século XXI insistem no erro? Dá que pensar.

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

O CAMINHO, A DISTÂNCIA E O FOGÃO


"Geralmente os dicionários admitem que a palavra “caminho” tenha origem num termo do “latim vulgar” – “camminu-”. Simplesmente, como é bom de compreender, o dito “latim vulgar” não é latim. O termo latino foneticamente mais próximo é “caminus”, e significa “forno, fornalha, fogão”, e logo nada tem que ver com percursos ou distâncias. 





Já em fenício “kmn” (em boa verdade não sabemos como era pronunciado, talvez [kamene]), significa “distância”. 



É portanto incomparavelmente mais provável que a nossa palavra “caminho” provenha de “kmn” fenício que de qualquer palavra latina que possa significar “forno”. De resto continuamos a usar a palavra “caminho” precisamente no sentido de “distância”."

In: A origem da Língua Portuguesa, p. 150


 Por estranho que possa parecer ainda há quem continue a afirmar a origem latina da palavra! Ele há gente para tudo!


segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Contudo, ela move-se!

Sei que por certo há muito quem não queira que o meu trabalho seja divulgado e coloque em causa as "verdades" nunca questionadas sobre a origem latina da nossa língua. Por isso não me admiro que haja quem queira abafar o meu livrinho "A Origem da Língua Portuguesa". Suspeito que é isso que me tem acontecido na divulgação do livro. A última foi uma verdadeira "sabotagem à moda antiga". A do meu livro apresentação prevista para a FNAC do centro Vasco da Gama foi anulada. A mim foi-me enviado um mail dizendo que a FNAC tinha cancelado a apresentação; à FNAC foi enviado um mail (pela mesma pessoa) dizendo que eu tinha cancelado a apresentação...
Alguém me quer calar, ou melhor, quer calar o que eu descobri sobre "A Origem da Língua Portuguesa". Até pode ser que me consigam abafar e com isso continuar a dizer que o português é um "latim mal falado". Mas a verdade é que o português é mais fenício que latim.
Os que pretendem evitar o progresso do conhecimento têm poder, mas...
Contudo, ela move-se!

domingo, 17 de novembro de 2013

OS "BISPOS" E A COMIDA QUE SE QUEIMA



Diz-se que quando a comida se queima sabe, cheira ou tem “bispo”. É claro que este “bispo” nada tem que ver com a igreja católica e as funções dos seus membros. Provém antes da ideia de “oferta queimada de alimentos” ou “sacrifício queimado de alimentos”. Em fenício “b” ou “bi” (prefixo) significa “na qualidade de”, “ašh” ou “išèh” é “oferta queimada, sacrifício queimado” e “spu” é “alimentos”. Portanto “bišèhspu” [pronúncia provável - bichèespu] significa “alimentos queimados”, “oferta queimada de alimentos”, “alimentos queimados no sacrifício”, etc. Quando se lê o Antigo Testamento vê-se que este era um ritual comum: sacrificar um animal, normalmente num sítio alto ou junto a uma grande árvore, e queimar uma parte dele como oferta aos deuses. A avaliar pela localização da maior parte dos nossos santuários campestres, que ainda hoje se situam nos bicos das serras, junto a lapas ou nascentes, etc., aqui pela Ibéria passou-se precisamente o mesmo. Portanto, quando alguém disser que a comida tem "bispo", não culpem a Igreja, ne nenhum dos seus membros...

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

O NOSSO TREMOÇO E O CALOR DOS GREGOS

Algumas vezes, a vontade descontrolada de criar uma relação entre o português e os "clássicos" (tão venerados pela nossa intelectualidade tradicional) aproximou-se do ridículo. Vejam como se tentou relacionar a palavra "tremoço", que como toda a gente sabe se dá bem com coisas frias (é evidentemente o caso da cerveja), com o "thérmos" grego, que significa "quente".


Mas na verdade a nossa palavra “tremoço” tem por certo origem fenícia e não grega, já que em acádio “tarmus” significa precisamente “tremoço”. Portanto a origem grega não tem o menor fundamento ou razão de ser.
Actualmente também não se compreende a vontade de ter uma ascendência grega, a menos que se queira com isso explicar as semelhanças no que respeita à crise...

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Para quem gosta de ver e ouvir...

A origem da língua portuguesa em pequenos vídeos explicativos sobre temas concretos, onde também se aborda a toponímia e a sua origem.
Podem ser vistos em:

A Origem da Língua Portuguesa:
https://www.youtube.com/watch?v=yhw8VEMTWGc

A Língua, o Poder e o Povo:
https://www.youtube.com/watch?v=2qkEZTgZ2Qo

O Artigo definido em português e em hebraico antigo:
https://www.youtube.com/watch?v=2qkEZTgZ2Qo

Toponímia portuguesa de origem fenícia:
https://www.youtube.com/watch?v=uLTRk8pM8Jk

Toponímia de origem fenícia - "Mal Lavado"
https://www.youtube.com/watch?v=ZxGSBlhQI-8

"Chada" - Origem e significado do nome:
https://www.youtube.com/watch?v=tCHuOGIkRvw

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

A língua antiga e a arqueologia

Conhecer a língua falada pelos nossos antepassados pode converter-se numa ferramenta sem igual para a pesquisa arqueológica. O estudo da toponímia dos nossos campos, quando realizada com base neste novo conhecimento, ajudará em muito aos levantamentos de campo e pode mesmo ajudar a esclarecer as funções de certos achados.
Dou alguns exemplos para que melhor se perceba: os topónimos que incluem o radical "cabra" usualmente referem-se a sepulturas. "Qabru" em acádio é "sepulcro"; "qbr" em ugarítico tem o mesmo significado, e "Qèbèr" em hebraico antigo é o mesmo. Assim, "Cabeça da Cabra" significa "cemitério", já que deve provir de "qbs qbr" que significa "sepulturas juntas" ou "concentração de sepulturas". Também o comum topónimo "Cabra Figa" se refere a sepulturas, mas neste caso de "incineração". "Cabra assada" é a evolução de "qbr asad" que não é senão "encosta das sepulturas".
Já nem comento tontices como a de admitir que "Cabra Assada" teria sido nome nascido de um petisco entre amigos em que a vítima era uma cabra. É claro que este tipo de interpretações é despropositado e infantil, e devia ser de uma vez afastado de qualquer área de conhecimento que se reclame de ciência.
Conforme "cabra" na maior parte dos casos nada tem que ver com domésticos do Homem, também topónimos como "Cardo", "Cardosa" ou "Cardoso" devem ter geralmente pouca relação com a planta espinhosa a que chamamos "cardo". "Qaradu" (ou "qrd") significa "guerreiro", "herói" e "âz" é "ser forte" (daí também o nosso "ás"). Logo "Monte da Cardosa" é provavelmente um local onde existiu uma fortificação com guerreiros.
Os milhares de topónimos diferentes que existem em Portugal, depois de devidamente estudados e compreendidos trarão novos conhecimentos. Veja-se ainda como exemplo simples, que os topónimos que contêm o radical "alc" correspondem a realidades relacionadas com caminhos. Há seguramente topónimos "Alcaide" que significam apenas "junto ao caminho".
Penso por isso que quem queira evoluir na arqueologia de campo terá que mais cedo ou mais tarde compreender (e aprender) a origem da língua portuguesa.
E sendo assim, mais vale cedo que tarde.

domingo, 27 de outubro de 2013

Origem do Nome "Brasil"



 


  Mapa em que se localiza a Oeste da Irlanda uma imaginária “ilha Brasil”

Abraham Ortelius em 1572


É sabido que uma mentira, repetida mil vezes, passa a ser verdade, ou pelo menos todos a passam a aceitar como se fosse. Foi assim que aconteceu com a explicação que se deu para a origem do nosso “Brasil”: tanto se bateu na tecla do “pau brasil”, na “cor de brasa”, no vermelho, que se passou a aceitar a ideia sem fazer mais perguntas. No entanto…
 José  Pedro Machado[1], atestando com fontes seguras, mostra que a palavra “brasil” já era usada em 1377 (logo muito antes da descoberta do Brasil) referindo-se a “terras distantes”: “E de brasill que trouuerem ou leuarem também vezjnhos come os que nom som vezjnhos pagam dizjmas…””.  A palavra usava-se no sentido de “colónia distante” e não tinha qualquer relação com a cor avermelhada da madeira (o tal “pau brasil”), nem com qualquer outra coisa vermelha.
A cartografia medieval inclui com regularidade uma “Ilha Brazil” (designada também por vários nomes foneticmente próximos, como “Ie Brezil”) em locais vários e isolados do “mar oceano”, e em todos os casos refere-se a localizações isoladas e remotas a Oeste da Europa.
De onde vem então este “brasil” que veio a dar o nome ao nosso país irmão? Quem acompanhe este blog ou simplesmente tenha lido “A Origem da Língua Portuguesa”, não estranhará que a origem do nome se possa encontrar no fenício.
De facto, em fenício o termo “br’” [brâ] significa “arrotear, desbravar”. As sequências consonânticas “br” ou “pr” são,  na toponímia portuguesa, das mais comuns, e referem-se geralmente a  terras abertas, limpas de vegetação natural, terras de semeadura. Existem muitas centenas ou milhares de topónimos que incluem este radical.
Já a palavra “aṣil” [asil], que significa “partes mais remotas da Terra” é, como se compreende, muito raro, surgindo em palavras como “Azilheira” (parte mais remota da serra), “Benagazil”, (casa da parte mais isolada do ribeiro), “Aguazil” (parte mais isolada do ribeiro), etc. As formas “Brasil”, “Brasileiro”, etc. podem referir-se a nomes dados a locais habitados por emigrantes regressados do Brasil, e devem ser relativamente recentes.
Na nossa Ilha Terceira, nos Açores, existe tambémum “Monte Brasil”, que é evidentemente uma penísnsula isolada na entrada de Angra do Heroísmo.
      

                

 
Monte Brasil, visto do mar e em representação cartográfica, Ilha Terceira, Açores.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Monte_Brasil,_visto_do_mar,_Ilha_Terceira,_A%C3%A7ores.jpg

Assim, “brasil” é o nome dado aos campos arroteados nas “partes mais remotas da Terra”, que era evidentemente no início do século XVI a terra que acabava de ser descoberta no continente americano. A nobreza e o clero, as gentes poderosas do século XVI, bem tentaram chamar-lhe “Monte Pascoal”, “Ilha de Vera Cruz”, “Terra de Santa Cruz”, “Nova Lusitânia”, “Cabrália”, etc., mas no fim venceu o povo que na sua linguagem corrente ainda com forte influência fenícia  a conhecia simplesmente por se tratar de uma colónia distante: Brasil


[1]   - Machado, J. P., “Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa”, Primeiro Volume, pág. 460.